Eça de Queiroz (1845-1900) foi um
grande escritor português. A obra "O Crime do Padre Amaro" foi o seu primeiro
grande trabalho, marco inicial do Realismo em Portugal. Foi o único romancista
português que conquistou fama internacional nessa época e foi duramente
criticado por seus ataques ao clero e à própria pátria.
O romance “O Primo Basílio”, escrito
entre 1875 e 1877 e publicado em 1878 é o seu segundo romance. O realismo
português tem na figura desse escritor o seu maior representante. Percebemos
que Eça, como o maior representante do realismo português, não fugiu dos temas
relacionados à sociedade, como se observa, por exemplo, em O primo Basílio. Passaremos
agora a observar o comportamento de seus personagens e a critica do escritor
feita à sociedade de sua época e ao romantismo, bem como sua estética
naturalista defensora dos novos padrões realistas.
HEREDITARIEDADE
A Revolução Industrial iniciada no
século anterior, na Inglaterra, provocou uma industrialização acelerada em
vários países. As cidades cresciam rapidamente. Camponeses transformavam-se em
operários urbanos e a vida cultural diversificava-se. Londres, Berlim, Viena e,
principalmente Paris, eram o centro de um vigoroso processo criativo. Enquanto
isso, Portugal mantinha-se apegado às glórias do passado. O país não chegou a
desenvolver uma burguesia empreendedora e capitalista, nem uma elite
intelectual significativa que fizesse desenvolver as artes e as ciências. Eça
morou durante anos em vários países mais desenvolvidos na função de diplomata,
talvez por isso, possuía uma aversão ao modo de vida rígido dos portugueses.
Portugal não possuía burgueses
capitalistas. A elite em Lisboa era ligada a acontecimentos passados, a
direitos adquiridos, a hereditariamente e não por inovação e esforço, não havia
renovação na sociedade e isso impedia que o país obtivesse avanços para o
futuro, o que indignava o autor, partidário de um movimento de jovens
intelectuais que reagia contra o atraso de sua geração em seu país, chamada de
“Questão Coimbrã”, que foi um dos primeiros sinais de renovação ideológica
ministradas pelos jovens escritores.
CRÍTICA AOS VALORES BURGUESES
A burguesia lisboeta é o alvo da
crítica presente em “O primo Basílio”, pois era uma classe social repleta de
ociosidade e hipocrisia. Os casamentos estavam expostos ao adultério, que
acontecia não só pela formação que as mulheres recebiam, mas também, pelo
caráter corruptível das pessoas em geral, como destacado na carta a Teófilo
Braga. Eça por intermédio deste livro inova a criação literária da época com
uma crítica aos costumes da burguesia de Lisboa e para dar mais ênfase a esta
crítica, ataca o casamento, uma das instituições mais sólidas daquele tempo. O
adultério já era trabalhado pelo Romantismo, todavia Eça explora o erotismo
quando detalha a relação entre Luísa e Basílio.
O realismo propõe uma criação voltada somente
a fatos objetivos e reais. O romance passa a ser uma obra de combate, arma de
ação reformadora da sociedade burguesa dos fins do século XIX, transformando-se
por um lado, em instrumento de ataque e demolição e por outro, de defesa
implícita de ideais filosóficos e científicos. (MOISÉS, 1972, p. 234)
CRÍTICA AO ROMANTISMO
Eça denuncia criticamente na obra, a
educação romântica que a mulher recebia, segundo a qual o casamento era o
objetivo final. Critica também os malefícios trazidos por essa educação, tanto
para os homens quanto para as mulheres. Há, ainda, no romance, marcas visíveis
de crítica a escola romancista, como por exemplo, as leituras feitas por Luísa,
tanto na adolescência quanto em sua fase adulta.
IRONIA DESMISTIFICADORA DA IDEALIZAÇÃO DOS
PERSONAGENS
A principal característica realista
presente em “O Primo Basílio” é identificada a partir do comportamento adúltero
dos personagens. Como o Realismo foca nas ideias objetivas e reais, Eça utiliza
a traição como principal crítica da obra. Luísa revive seu primeiro amor com o
primo Basílio. Foram namorados quando jovens, mas ele foi embora. Tempos
depois, Luísa já estava casada com Jorge quando seu primo Basílio retorna a
Lisboa. Seu marido estava viajando para muito longe a trabalho, com isso, a
tentação, a sedução e o desejo sufocam-na, fazendo com que não resista aos
investimentos galantescos de Basílio. Entrega-se a ele sussurrando: “Jesus! Não! Não!” - (...)“Apertou-a contra
si, beijou-a; ela deixava, toda abandonada; os seus lábios prendiam-se aos
dele. Basílio deitou um olhar rápido, em redor, pela sala, e foi-a levando
abraçado,...
Luísa é uma jovem sonhadora e ociosa da
sociedade lisboeta que acaba envolvida com seus sentimentos por Basílio, seu
primo, com quem se reencontra, após anos de distância. Achando-a sozinha, já
que Jorge, o marido, viajara a negócios, Basílio serve-se de sedução e
galanteios, até levá-la a se envolver profundamente consigo, tornando-se seu
amante. Juliana, a criada, descobre a correspondência trocada por ambos e
chantageia a patroa. Após sofrer muitas humilhações e ter que se submeter aos
caprichos da crudelíssima criada, Luísa consegue, ajudada por seu amigo
Sebastião, recuperar as cartas e Juliana é pressionada a entregá-las, ante as
ameaças, acaba morrendo do coração. Com o seu profundo sofrimento, Luísa
adoece. Basílio se encontra nesta ocasião, longe de Lisboa. Jorge regressa ao
lar. Certo dia, chega uma carta do primo para a esposa e o marido intercepta a
correspondência e toma conhecimento de tudo o que ocorrera. Mesmo desesperado e
sofrendo demasiadamente, Jorge resolve perdoar Luísa. Ela, no entanto, piora
muito ao saber que o marido descobrira tudo o que fizera de errado, e vem a
falecer. A reação de Basílio, ao saber da morte dela, é de desgosto, por ter
perdido sua diversão em Lisboa.
Durante toda a narrativa, os
personagens de “O Primo Basílio” denunciam e acentuam o compromisso com o seu
tempo: a obra funciona como uma arma de combate social. A burguesia, principal
consumidora dos romances nessa época, deveria ver-se refletida na obra e nela
encontrar seus defeitos analisados objetivamente, para, assim, poder alterar
seu comportamento.
Como bom observador e perfeito
desenhista da realidade, Eça de Queirós caracteriza os personagens com variada
notação de detalhes. Tal caracterização, sobretudo a de natureza física, é
feita geralmente por processos diretos, seriação de atributos ou de locuções
atributivas. Seus personagens são planos e construídos de acordo com os
modelos deterministas da escola naturalista, isto é, o homem é o resultado do
meio em que vive, do seu tempo e de sua raça. Apesar de meros tipos
sociais, seus personagens criam história e nos fazem mergulhar de forma
atemporal em todas as sociedades e, não raro, encontramos esses mesmos tipos em
nosso meio, vencendo o tempo e a distância social e imortalizando-se na forma
de verdadeiras caricaturas universais.
O narrador retrata como protagonista
nesta obra, uma Luísa frágil, dependente e de personalidade socialmente
moldada, construindo nela uma típica mulher burguesa, a qual de forma acentuada
como Emma Bovary, se limita ao espaço doméstico. Ademais, as relações intra e
também extrafamiliares ocorrem de maneira díspar e contraditória, uma vez que
são observadas distorções entre as afirmações e julgamentos e as ações
empreendidas pelos personagens. Deste modo, prevalece a comicidade na medida em
que o leitor espera determinada ação da personagem, mas depara-se com uma ação
divergente. Assim, é possível afirmar que, ao construir a personagem Luísa, Eça
atua “naturalizando” o ideário feminino enquanto essencialmente paradoxal, uma
vez que para ele a duplicidade era intrínseca a Luísa.
ANÁLISE DA OBRA “O PRIMO BASÍLIO”
O livro O Primo Basílio foi escrito em
um momento de consolidação da escola – realista/naturalista em Portugal. O
Realismo português propôs uma nova literatura que, em oposição ao Romantismo,
tivesse uma função social clara, reformadora e engajada, com o objetivo de
condenar os maus hábitos da sociedade lisboeta como: a crítica social, a
exploração da sexualidade, a tendência à construção de personagens marcados
pela baixeza de caráter, aos costumes, a narrativa irônica e a religião. Nessa
nova perspectiva de literatura, Eça tinha em seu projeto "Cenas da vida
portuguesa", nas quais pretendia pintar um retrato de sua sociedade,
sobretudo em “O Primo Basílio”. Eça, em carta a Teófilo Braga, aponta sua
intenção, ao escrever “O primo Basílio”. A
minha ambição seria pintar a sociedade portuguesa, tal qual a fez o
constitucionalismo desde 1830 e mostrar-lhe como num espelho, que triste país
eles formam eles e elas. (...) "Ataco a família lisboeta, produto do
namoro, reunião desagradável de egoísmos que se contradizem [...] um pequeno
quadro doméstico, extremamente familiar a quem conhece bem a burguesia de
Lisboa. [...] - enfim a burguesinha da Baixa."
No ano de sua publicação, a recepção de
crítica do romance foi bastante negativa, principalmente pelos setores
conservadores da sociedade lisboeta, que além de serem contemplados no retrato
presente na obra de Eça, também estavam presos ao Realismo. Destaca-se, ainda,
o fato do romance não possuir muitas características de estética Naturalista
que revolva o gosto por termos técnicos das ciências, além de pregar o
determinismo, em que o ambiente influenciaria os personagens. Dentre as críticas negativas, destaque-se a
publicada por Machado de Assis, em 1.878, na revista O cruzeiro.
Eça de Queirós ataca uma das
instituições mais sólidas: o casamento. Com personagens despidos de virtude,
situações dramáticas geradas a partir de sentimentos fúteis e mesquinharias,
lances amorosos com motivações vulgares e medíocres, apesar de tudo isso, ao
mesmo tempo em que ataca, desperta o
interesse da sociedade lisboeta. Inova também ao incluir diálogos sobre homossexualismo.
O autor, que já mostrara sua opção por uma literatura ácida e nada sentimental
em O Crime do Padre Amaro, cria personagens fisicamente decadentes, cheios de doenças e catarros e de comportamento sexual
promíscuo. O Primo Basílio é uma obra naturalista e realista.
Por
Marcos Cavalcante.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SOLAR, Ambiente Virtual da UFC (Universidade Federal do Ceará). Disponível em: http://www.virtual.ufc.br/solar/aula_link/SOLAR_2/Curso_de_Graduacao_a_Distancia/LLPT/I_a_P/Literatura_Portuguesa_II/aula_04/imagens/02/primo_basilio.pdf
Acesso em 05 de Maio de 2016.
QUEIRÓZ, Eça de. O Primo Basílio. 1°ed. São Paulo: Martin Claret, 2007.
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. 33°ed. São Paulo: Editora
Cultrix, 2005.
Resumos
de Livros, Portal Brasil Escola. O Primo Basílio. Acesso em 15/05/2016.
C.I.T.I.
Centro de Investigação para Tecnologias Interativas. O Primo Basílio - Resumo.
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa. Acesso em 15/05/2016.