terça-feira, 26 de abril de 2016

Medievalismo de Alexandre Herculano e Almeida Garrett


        Na primeira geração romântica é possível perceber que, embora prevaleçam algumas características neoclássicas, o nacionalismo, o medievalismo e o historicismo também estão bem presentes, como destacam os autores Amora, Moisés & Spina (1961, p.90):

O primeiro “momento” é representado por Garrett, Herculano e Castilho. Cada qual a sua maneira, cada qual com seus prejuízos de formação, escolar ou não, contribuíram para que se definisse o Romantismo em Portugal.
Alexandre Herculano e Almeida Garret apareceram na prosa trazendo características nacionalistas para a literatura portuguesa, devolvendo uma importância ao país que na época muito tinha perdido nos contextos político e histórico. Para tanto, buscam os modelos medievais de heróis, o assunto histórico e o passado glorioso. O medievalismo português instaura-se, principalmente, por esses motivos.
Assim é importante consignar que Garrett e Herculano contribuíram com diferentes atuações para este período literário. Sejam por motivos temperamentais ou acidentais, os dois autores tiveram uma decisiva colaboração na consolidação do romantismo.
Em “A dama pé-de-cabra e A Morte do lidador”, respectivamente, o escritor português, Alexandre Herculano, segue uma tendência reflexiva, critica e irônica ao contexto histórico e cultural do final do século XIX. Não parece demais dizer que o escritor satiriza, em vários momentos das narrativas, o exagero das punições cristãs ou pelo menos daquelas anunciadas e previstas por essa tradição.
Herculano com suas obras liberais, logo cedo desgosta o clero com o qual entra em polêmica em 1850, e isso, pode ter motivado sua forma critica e irônica de envolver determinado escárnio religioso nas entrelinhas de suas obras. Daí pode-se também, pensar que o poeta mergulhado em uma dúvida existencial, busca através de seus escritos, denunciar sua angústia que flutua entre o desejo de liberdade de pensamento e proibição clerical.
Como comparativo inicial entre as duas produções, podemos citar a questão da punição por ordem divina. Durante as narrativas, somos confrontados por essa questão em diversas situações. A real história da Dama pé-de-cabra, o seu “surgimento”, que envolve o conde Argimiro, já é o modo de punição que desencadeia todos os outros. Só para nos situarmos no contexto histórico religioso em A dama pé-de-cabra. A condessa sonha três noites consecutivas com um homem e acaba encontrando-se com ele na ausência de seu marido que partiu há dois anos. Tal traição é planejada por Deus para punir o conde Argimiro (marido da condessa), que havia quebrado um juramento feito ao pai dele. Pois bem: a condessa, porque foi levada a trair seu marido, o conde, padecesse, é assassinada por ele e torna-se a dama pé-de-cabra, alma penada fadada a peregrinar o resto de seus dias pela terra.
Podemos, em segunda estância comparativa, refletirmos sobre a questão da ironia, enquanto construção discursiva, procedimento que, sem dúvidas, permeia toda a construção de ambos os contos do escritor. A ironia presente em “A dama pé-de-cabra” fundamenta-se na tensão, quase contradição, que sobreleva dessa narrativa por meio das sutis dissonâncias que caracterizam o fazer desse narrador. Desse modo, é através dessa contraditória ambiguidade, que o leitor tem acesso a características significativas do conto. No entender de Beth Brait temos que: 
A ironia romântica pode ser traduzida como “o meio que a arte tem para se auto representar”, como articulação entre filosofia e arte, poesia e filosofia, na medida em que não estabelece fronteiras entre princípio filosófico e estilo literário. Além desse aspecto caracterizador (...) há ainda outros a serem sublinhados: a ideia de contradição, de duplicidade como traço essencial a um modo de discurso dialeticamente articulado; o distanciamento entre o que é dito e o que o enunciador pretende que seja entendido; a e contraditória desse discurso. BETH BRAIT (1996). 
Parece que, “em A Dama pé-de-cabra”, a ironia romântica não se presta apenas a mostrar o caráter ficcional da narrativa, mas, sobretudo, o caráter ilusório de qualquer discurso, inclusive, daqueles que pretendem ser centralizadores.
Apesar das semelhanças existentes nas duas obras como falamos anteriormente, em “A Morte do Lidador”, há certa semelhança com a chamada epopeia. Para nos situarmos um pouco mais sobre esse contexto. A história se passa durante a invasão árabe na Península Ibérica, um dos temas favoritos do autor. Ele mostra a luta dos cristãos para expulsar os mouros (muçulmanos). O personagem principal, o cavaleiro Gonçalo Mendes da Maia, possui integridade e bom caráter, e assim como os heróis épicos das epopeias, ele não possui vícios e tem uma personalidade exemplar. É um modelo de herói que merece orgulho e que possui o objetivo de trazer triunfo a sua pátria, povo e reino.
Outro ponto comparativo muito comum nas duas narrativas românticas de Herculano, é a utilização de personagens com características sobre-humanas, dotadas de certos poderes extraterrenos, vítimas de maldição ou de santificação. Conforme afirma Antônio José Saraiva, em História da Literatura Portuguesa.
 “... O transcendente desempenha um papel essencial, quer pelo tema, quer pelas personagens, quer pelo vocabulário, como mostra o emprego frequente de nomes como tremendo, terrível, solene, santo, maldito, precito”.
Sobre a linguagem utilizada nas duas obras, é importante ressaltarmos que ambos possuem forte influência dos vocabulários do Século XII, por suas batalhas territoriais e por usarem a linguagem Galego-Português, com intenção de fazer o leitor sentir a ligação entre os tempos passado e presente e a religião católica muçulmana se encaixando totalmente no romantismo e, ainda, por estar presente o nacionalismo, o historicismo e o medievalismo. Herculano traz nesses textos, fatos históricos anteriores ou posteriores ao fato propriamente relatado.
O que tenho a acrescentar a esse comparativo com relação a peça Frei Luís de Sousa de Garrett e os dois textos anteriores, é a diferença com que expõem a hipocrisia moral vigente na obra disfarçada de grande honradez.
Na peça, D. Madalena tem receio de Deus e teme o seu castigo. Nisso assemelham-se. Ao ficar sabendo que tornou-se bígama, opta por ingressar num convento. Hora recear não é amar. Diferem-se na denuncia de que o deus dos personagens não é um deus bom que preside seus destinos, nem é o amor a ele que as move, e sim, o medo.
A insatisfação com a realidade fez-se presente na obra de Garrett. O autor defendeu a herança do passado, repudiando a nova política que ali se fazia com homens que agora representavam uma mentalidade burguesa invisível. É importante ressaltar que o romancista representou uma cultura burguesa progressista, participou de lutas pelo progresso e pela democracia, porém, demonstrava certo apego ao patrimônio cultural que, naquele momento, estava sendo ameaçado pelo grande crescimento do capitalismo e da burguesia o que, de certa forma, acarretaram na transformação dos valores culturais.
Nesse sentido, é compreensível a semelhança da atualidade que esta obra ganha em 1950, louvando aos bons valores lusitanos, dotando o cinema nacional de mais uma obra didática louvável, o seu ritmo lento, os diálogos declamados, a monotonia dos cenários tornam-na um filme pesado para os espectadores contemporâneos habituados e outros recursos narrativos.
Garret e Herculano foram os principais obreiros a levar a cabo uma revolução cultural que instalou o passado como força vivificadora do panorama politico-cultural do país. É sabido, porem que, em se tratando de um comparativo, o medievalismo garrettiano se verte em moldes distintos do medievalismo herculaniano, já que como sublinha Buescu (1997:312), o primeiro contempla o romanceiro e a arrumação doutrinária que Garret deu a historia da literatura portuguesa, enquanto o segundo diz respeito a centralidade que a idade media adquire, quer nos estudos de historiografia, quer na obra narrativa de Herculano. Para o escritor, a idade media era imensamente poética porque tinha crenças e profundamente simbólica porque era poética. (Herculano, 1985:319). A lealdade e a coragem dos cavaleiros medievais estão, por seus turnos, bem vincadas em narrativas como A morte do Lidador (1839) mencionada acima, onde sobressai o espírito combativo de Gonçalo Nuno (Herculano 1992:194-196) e o valor indomável de Gonçalo Mendes de Maia (Herculano 1992b:101). Igualmente digno de realce é o destaque conferido ao castelo medieval e a descrição da batalha em que participa Gonçalo Mendes de Maia (Herculano 1992b:108).

Por: Marcos Cavalcante.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. 
http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/literatura/obras_completas_literatura_brasileira_e_portuguesa/ALEXANDRE_HERCULANO...
SOLAR, ambiente virtual da UFC (Universidade Federal do Ceará) – Literatura portuguesa II, aula 02, fases do romantismo.
FACOS - http://facos.edu.br/publicacoes/revistas/ensiqlopedia/outubro_2013/pdf/o_romance_portugues_nas_viagens_de_almeida_garret.pdf.

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