A obra “Amor de perdição” de Camilo Castelo
Branco, trás algumas características contrárias ao racionalismo e ao iluminismo
e aponta para uma concepção de mundo focada no indivíduo, reproduzindo as
tragédias, amores funestos, pensamentos utópicos e desejos de fuga. A obra
relata os infortúnios de amor de Simão e Tereza, que são dois jovens
pertencentes a famílias rivais. O enredo se assemelha a história de Romeu e
Julieta, cujas famílias provocam a separação do casal por uma questão de honra.
A parte mais representativa acontece quando a proposição da “morte por amor” é
abordada alcançando o ápice da história.
O drama é escrito
enquanto Camilo estar na prisão e é considerada a produção mais comovente do
autor, podendo ser confundida com sua própria história. Os aspectos
característicos da segunda fase do Romantismo português (noção positiva da morte, egoísmo, forma ideal de se imaginar o amor
como grande estimulador da vida, idealização da mulher que era endeusada,
idolatrada, enaltecida, virgem) são notados no desenrolar do romance. O
comportamento apaixonado de Simão e Tereza é evidenciado nas cartas que um
envia ao outro com a finalidade de estreitar uma conexão entre ambos e de
relatar as eventualidades que ocorria entre eles, seus propósitos, influenciar
um ao outro a tomar certas atitudes, também justificar as atitudes tomadas e
demonstrar seus sentimentos. Foi à maneira mais simples, direta e eficaz
encontrada pelo casal para se comunicar, uma vez que estavam proibidos de se
relacionar. Nessas cartas são manifestadas emoções típicas do Romantismo.
Podemos observar bem isso em uma das passagens das cartas:
“Meus pai diz que me vai encerrar num
convento por tua causa. Sofrerei tudo por amor de ti. Não me esqueças tu, e
achar-me-ás no convento ou no Céu, sempre tua do coração, e sempre leal. Parte
para Coimbra. Lá Irã dar as minhas cartas; e na primeira te darei em que nome
hás de responder à tua pobre Tereza”.
Nota-se ai, um
comprometimento de fidelidade a qualquer custo, apesar de todo o sofrimento,
estando no convento ou no céu (depois de
morta). Tereza ansiava por um amor pleno, primoroso, virtuoso e puro.
Observemos mais um trecho:
“A morte é mais que uma necessidade, é uma misericórdia divina, uma
bem-aventurança para mim”.
Aqui, é revelado um
conformismo e uma espera de pioras e de tristeza. Tudo isso ocasiona a vontade
de abandonar a realidade, o escapismo, e é depositada a esperança unicamente na
morte de onde se espera a solução para seus problemas. A morte era o único
remédio para um amor irrealizável. Essas reações são consideradas
ultrarromânticas e fazem parte das características da segunda geração do
Romantismo.
Dá para percebermos,
a partir da narrativa, que o amor romântico excede o sentimento da dor, da
aflição, da angústia, abdicar da vida é o meio mais eficaz para consolidar os
desejos intensos e apaixonados das emoções humanas. Em oposição a si mesmo e as
maldades externas, sustentam o mais imaculado desejo do espírito. O amor de
Simão por Tereza torna-se tão intenso que ele prepara-se para morrer por ela,
caso fosse necessário. O jovem encarou o pai e o pretendente da donzela, foi
preso por homicídio e depois, ao ficar sabendo da morte de Tereza que morreu
aos poucos corroída pelos padecimentos, o rapaz também morre devaneando por
causa de uma febre inesperada. Vejamos seu discurso de desespero:
“O destino há - de cumprir-se...
Seja o que o Céu quiser”
A distância que
sempre separou Simão e Teresa levou-os à invenção de uma forma de comunicação bem
típica da época. As cartas. O narrador resolveu o problema do casal,
concernente a comunicação entre ambos, mas aproveitou esta presença para lhes conferir
funções diversas, e nisso, podemos perceber o quanto um registro discursivo
pode alcançar relevância funcional. As cartas são de extensões diferentes, não
são regulares e os seus discursos não são sempre do mesmo tom.
A obra “As Pupilas do Senhor Reitor”, de Júlio
Dinis, romance pertencente à terceira geração romântica portuguesa, apresenta
características que denunciam a redução dos traços românticos e a adoção de
novos detalhes que a qualifica como um pré-realismo.
O amor vivido por
Daniel e Margarida. O casal que se apaixona ainda quando crianças.
Margarida fica órfã
muito cedo e vive uma infância de muita solidão e padecimento. É uma pessoa
benevolente e ama intensamente a Daniel. Este, por sua vez, por não se adaptar
ao trabalho rural, é preparado para entrar em um seminário, porém o reitor
descobre seu namoro com Margarida, percebe que ele não tem vocação e sugere
para seu pai, José das Dornas, que o
mande estudar medicina no Porto.
Ao compararmos as
narrativas de Júlio Dinis e Camilo Castelo Branco, percebemos que ambas
protagonizam em um cenário que demonstra muito sofrimento, no entanto,
diferentemente de “Amor de Perdição” que termina com a triste e infeliz morte
de Simão e Tereza, apesar de acreditarem em um reencontro após a morte, em “As
Pupilas do Senhor Reitor” o casal apaixonado fica junto e feliz para sempre.
Margarida é uma
espécie de heroína romântica, humana e apta a perdoar, porém muda de perfil com
o passar do tempo devido aos desgostos que passa ao longo da sua vida. Essas
características da personagem agregam a obra traços e perspectivas realistas.
Vemos que o perfil desse novo personagem se opõe ao de Tereza, personagem da
obra comentada anteriormente, que mesmo sendo persistente e se negando a
obedecer às ordens de seu pai, ainda assim é um personagem de figura frágil e
típica do ultrarromantismo. O amor demonstrado nos personagens de ambas as
obras é bastante intenso, no entanto, uma delas morre com a ausência de seu
amado, enquanto que a outra continua sua vida normalmente, torna-se professora,
ajuda muitas pessoas e continua amando a Daniel para sempre em silêncio.
Daniel de “Amor e
Perdição” é um mocinho esbanjador, frívolo, fútil, inconstante nas relações
amorosas. Um típico conquistador que ao se apaixonar passa a conhecer o
verdadeiro amor e então se redime, muda completamente sua postura tornando-se
um homem confiável e digno. Simão, em “As
Pupilas do Senhor Reitor”, assim como Daniel, também muda seu comportamento
agitado, tumultuoso e impetuoso, quando se apaixona por Tereza. O amor faz de
Simão um jovem honesto, com boas intenções, pudico, estudioso e até devoto. No
entanto, as formas de amar dos dois jovens são bem distintas. O amor que Daniel
sentia por Margarida é esquecido por um bom tempo. O jovem chega, inclusive, a
se interessar pela irmã de Margarida da qual seu próprio irmão está noivo. Já
Simão, não sobrevive com o distanciamento de Tereza e mesmo longe,
impossibilitado de viver esse amor, evita se aproximar de Mariana, moça que
está imensamente apaixonada por ele. O casal vive uma paixão tão intensa que
passa a não conseguir sobreviver um sem o outro. Essa característica de amor
que ama loucamente é também típica do ultrarromantismo. O amor surge fantasiado
na trama, impossível de se realizar. O que difere da história de Daniel e
Margarida também, é que ela conserva seu amor por vários anos mesmo afastada do
amado enquanto ele se corrompe pelos costumes da cidade e se transforma em um
mulherengo impetuoso, esquecendo-se de Margarida. Só depois de a moça colocar
sua honra em risco para proteger a irmã é que Daniel comovido pela renúncia da
jovem lembra-se do seu amor de infância e tenta reconquistá-la.
CONCLUSÃO
As duas obras são
essencialmente românticas, já que apresentam protagonistas românticos que
precisam encarar situações conflituosas para realizar seu amor, além da
perceptível conexão entre o amor e a dor. No entanto, como um pré-realismo,
poderemos citar para concluir, um trecho de “As Pupilas do Senhor Reitor”, que marca um diferencial entre essas
obras de segunda e terceira fases românticas portuguesas, e isso, certamente,
enriquecerá esse ensaio. No capítulo VI, como veremos abaixo, há um estudo
psicológico evidenciado através da biografia da personagem Guida, lembrando a
descrição de caracteres humanos da geração realista:
“Era bem justificada a saudade de Margarida. A curta biografia dela a
fará compreender. Guida era o fruto único do primeiro matrimônio de seu pai,
cuja morte recente acabara de a fazer órfã de todo. Entregue ao domínio de um
madrasta, que não desmentia pela sua parte, a fama que de ordinário acompanha
este pouco simpático nome, tivera a experimentar, nos maus tratamentos
recebidos e na frieza ou declarada aversão, como que lhe dispensavam os poucos
cuidados de que se via objeto, toda a amargura de uma existência sem carinhosas
afeições, esse tão necessário alimento ao coração das crianças. Arredada de
propósito de casa,e passando dias inteiros nos montes, a acompanhar o gado,
habituou-se de pequena a vida da solidão – e é sabido que hábitos de melancolia
se adquire nesta escola. Foi, pouco a pouco, contraindo o caráter triste e
sombrio que é o traço indelével que fica de uma infância, à qual se sufocaram
as naturais expansões e folguedos, em que precisa de transbordar a vida
exuberante dela. Por isso se afeiçoara a Daniel, o único que a viera procurar à
sua solidão e oferecer-se como o suspirado companheiro das suas horas infantis.
Vê-lo desaparecer agora, era assistir ao desvanecimento da mais intensa das
suas alegrias; e a sensibilidade nascente da pobre criança recebia uma nova
têmpera nesta separação dolorosa”.
Por Marcos Cavalcante.
(Acadêmico em Letras Português e Inglês pela UFC (Universidade Federal do Ceará)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ABAURRE, Maria Luiza; PONTARA, Marcela
Nogueira; FADEL, Tatiana. Português: Língua, Literatura e Produção de texto.
São Paulo: Moderna, 2004.
CAMPEDELLI, Samira Yousseff; SOUZA,
Jésus Barbosa. Literaturas brasileira e portuguesa: teoria e texto. São
Paulo: Saraiva, 2000.
PELACHIN, Márcia Maisa; PEREIRA, Helena
Bonito. Português: na trama do texto. São Paulo: FTD, 2004.
Internet:
www.google.com.br
www.gratisvideoaula.blogspot.com
http://fernandajimenez.com/tag/simao-e-teresa/
Acesso em 20.04.2016
http://www.coladaweb.com/literatura/romantismo-em-portugal
Acesso em 20.04.2016
http://nelsonsouzza.blogspot.com.br/2011/10/amor-de-perdicao-camilo-castelo-branco.html
Acesso em 20.04.2016
http://cassioletras.blogspot.com.br/2011/07/analise-do-comportamento-apaixonado-nas.html
Acesso em 20.04.2016.